domingo, 9 de maio de 2010

23


Assim que a taça pousou sobre minha mesa, avistei-os. Lá ela estava, deslumbrantemente linda e num vestido vermelho, exatamente como estive quando em seu lugar. E ele? Igual. Sorria, andava, acariciava.. tudo da mesma maneira! Que graça as pessoas vêem na repetição? Respirei fundo, dei um sorriso cordial ao garçom e continuei na minha espera, dessa vez acompanhada do álcool. O nó em minha garanta parecia ter amargurado o vinho. Resolvi ignorar o que via, mas era impossível: quanto menos queria, mais fazia, na ilógica mais lógica dos recalcados. Para minha maior tortura, 'Yes it is' se fez ouvir e seu arranjo e letra embalando a dança dos dois trouxeram bombardeios de flashes de lembranças à tona, dos quais tentava me livrar com apertões no guardanapo sobre perna. 'Please don't wear red tonight, this is what I said tonight...' foi muito para mim. Levantei e me dirigi ao banheiro. Precisava me movimentar, preencher minha visão com qualquer outra coisa - já bastava o que tinha visto e que, certamente, ficaria impregnado - mas como não podia (nem adiantaria!) ficar ali a noite toda e como esse pensamento me veio à cabeça, saí logo em seguida. Ele chegara. E, como num passe de mágica, nada do que via, ouvia ou qualquer outra sensação que meus sentidos pudessem me proporcionar, me afetou. É, mais uma vez descobri o quanto se ganha quando se sabe distinguir falta de abstinência.

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